Playlists Musicais

By Eduardo Albuquerque - 2/23/2015



É muito comum para um roteirista trabalhar concomitantemente em múltiplos projetos; cada um em diferente estágio. Muitas vezes isso é ótimo, pois dá espaço para os Homenszinhos que moram no fundo da sua cabeça fazerem o trabalho deles – quando bater numa parede, é só mandar fax pra eles e focar em outro projeto. No entanto, para a “frente” da sua cabeça pode ser bem confuso.

Eu tenho um truque que funciona bem: crio uma playlist de músicas que, para mim, tem a ver com cada história e, ao trocar de projeto, dou um play nela para me lembrar do clima e entrar nele. Já ouviu uma música que te transportou à uma época? Então. A idéia é a mesma.

A memória musical é uma das mais fortes no nosso corpo; dizem que é a última que se vai. Existe um trabalho muito legal de musicoterapia com pacientes com Mal de Alzheimer no qual cada membro da família designa uma melodia individual para se apresentar - tipo “eu sooooou ooo Eduaaardooo” e “eeeeEEuuu sou a Fulaaaana” – de maneira que o paciente, por estar lidando com música, consegue fazer as ligações cognitivas e reconhecer a pessoa. Então, no nosso caso, a playlist é uma forma rápida e certeira de desligar uma chave e ligar outra. De entrar no clima e rapidamente lembrar e absorver todo o tônus do seu projeto.

A playlist pode ser do tamanho que for, mas geralmente a faço com umas 5 músicas (o suficiente para te dar um clima e não ser monotemática). Sempre tento, nesta playlist, apontar momentos do filme, ou seja, não é apenas denotar o “overal mood” do projeto, mas meter umas músicas tipo “essa aqui representa o momento de vitória dele no terceiro ato”, “essa aqui é a música do romance do protagonista” e por aí vai. Se der, coloco também em uma ordem lógica essas músicas - abertura/resumo geral do clima do filme, personagem principal, antagonista, fun and games, bad guys close in, all is lost e triunfo do terceiro ato – de maneira que, ao ouvir a playlist do início ao fim, eu “ouço” um resumo do filme na minha cabeça.

O melhor é que é um pouco como a idéia de escrever para um tipo de ator; você pode escolher a música que for. Você não deve pensar nessas músicas para estarem de fato no filme, logo não tem que se preocupar em conseguir permi$$ão com os compositores/editoras, não tem que convencer produtor/diretor sobre a necessidade da música... é importante reiterar: esta idéia de usar playlist é um instrumento para o roteirista e não para o filme. Um filme de época dificilmente vai ter música moderna rolando, né? Mas “One” do Metallica pode, para você, fazer sentido sobre a emoção do protagonista no terceiro ato e você coloca na playlist. Então, fique à vontade! Escolha aquilo que toca você e traduza para você o momento que você precisa entender/sentir.

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3 comentários

  1. Muito boa ideia. Ja usei musica para ajudar na construcao de cenas como mais agitada, mais lenta, mais emotiva. Mas nao tinha pensado em usar nesse sentido. Ate porque eu tambem trabalho com varios projetos

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  2. Sobre o que disse de trabalhar com varios projetos ao mesmo tempo que comentou. Eu faco isso e alguns momentos achei errado, mas de alguma forma isso funciona pra mim. Gostariabde ter a sua opiniao sobre, o que faz para ajudar a nao se perder, obque tem de informacoes sobre

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    1. Não se reprima; não tem certo ou errado, as coisas são do jeito que são e a verdade é que o processo de realização de um roteiro é mesmo demorado e multi-facetado. Não é uma exclusividade do Brasil, muito menos sua/nossa; roteiros levam tempo mesmo e roteiristas fazem múltiplos projetos ao mesmo tempo, cada um em uma fase diferente. Mesmo os que trabalham na TV (ou seja, se regem por um esquema mais "empregatício"), apesar de estarem trabalhando exclusivamente naquele projeto, eles estão lidando com deveres roteirísticos relacionados à edição do primeiro episódio ao mesmo tempo que supervisionam a filmagem do episódio 2, a roteirização do episódio 3, o outline do episódio 4 e quebrando a história do episódio 5!

      Nestes casos, como é tudo em cima do outro, acho que nem tem como se eprder, você está consistentemente vendo e revendo o todo. Mas no caso de filme, que tem longas pausas entre a sua entrega e a volta dos notes dos produtores etc. eu acho que essa dica da playlist é muito boa. Além de, claro, reler o que você escreveu nunca fazer mal, né? =)

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