Não proteja seu herói!

By Eduardo Albuquerque - 6/29/2015


 
Inúmeras vezes me pego achando que algo não clica com o protagonista. "Está sem graça; qual o motivo pelo qual o leitor vai torcer por ele?". Tudo porque, como um pai orgulhoso e protetor, removi todos os espinhos e obstáculos e desenhei meu herói muito certinho, honesto, limpinho. E isso é péssimo para a história.

Nosso protagonista tem de ser o personagem mais distante de seus objetivos. Não apenas para o "feito" deles ser notável e digno de ser assistido - qual a graça de ver um filme sobre como um milionário filântropo doa dinheiro para combater a fome na Africa? - mas também para que promova uma boa catarse ao fim de seu difícil trajeto.

Não tem problema nosso herói ser/começar sujinho, escroto, moralmente errado. Pelo contrário! Sendo-o, é capaz de ficar mais fácil de contar sua história. Ele só não pode terminar a história assim. Ao final, aprendendo com todo o trajeto, ele se torna alguém melhor, limpo, moralmente correto. Veja as coisas físicas que ele quer (a garota, o prêmio etc.) e veja como ele pode estar bem longe disso por conta de seus defeitos. Foque no final do seu filme: seu herói vira o maior jogador de futebol do mundo? Que no início ele não tenha habilidade nenhuma ou; que tal um problema motor para que o "impossível" aconteça? Não comece com ele sendo indubitavelmente uma promessa, atlético e saudável como um touro, bom de bola, com a cabeça no lugar e bem de grana pra poder apostar na carreira. Porra, pra que ver isso? O cara tá pronto. Mesmo que você jogue obstáculos no trajeto, esse cara aí tem tudo (inteligência, saúde, habilidade, estabilidade financeira...) para superá-los. Nós queremos duvidar de alguém que não tem a menor chance - um cara rico, polido, bonzinho, mirrado, mas habilidoso, que vai jogar futebol no meio de ogros e terá que virar bárbaro para sobreviver e se introsar (ou apostar na habilidade pra se destacar e com isso mil outros dilemas que virão, como o isolamento?).

Ser herói é isso; fazer dos impedimentos sua força motivacional. Lembrar ao público que tudo é possível se estivermos dispostos a lutar. Seu herói é um Herói; ele não precisa de proteção. Proteja seus vilões. Dê tudo pra eles, para que eles percam e busquem reaver. Odiamos privilegiados (e quem tem proteção, nesse mundo de cada um por si, é privilegiado, correto?), portanto não torceremos para eles e sim pro seu herói que, com quase nada, contra todas as possibilidades, seguiu buscando seu sonho, cativou pessoas para torná-lo mais forte onde era fraco e nunca desistiu, mesmo quando tudo parecia perdido, de buscar seu verdadeiro objetivo: consertar aqueles seus defeitos que o faziam mais fraco.

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