BRAINSTORM: Blue is the newest color

By Eduardo Albuquerque - 3/05/2015



Semana passada, uma boba questão de "white balance" gerou milhares de kbytes de discussão na internet sobre a cor de um vestido. Você, que é do audiovisual, versado nessas paradas, nem participou da celeuma (ou participou porque a carne é fraca e não havia nada melhor pra fazer). Mas agora, pegando o vestido como gancho, tá na hora da gente fazer um brainstorm... colorido.

Sempre me intrigou muito a convenção que fazemos como raça humana para uma porrada de coisa. Convenções sociais você consegue até encontrar algumas explicações de seus porquês: costume, maioria, razoabilidade etc. Mas e quando você vai para coisas básicas? Como chegamos à convenção de que o amarelo é o amarelo? E quem diz que ele é o mesmo amarelo?

Assim; de certo que - a não ser que você seja daltônico - eu e você designamos ao mesmo valor o que chamamos de "amarelo". No entanto, será que processamos da mesma forma? Tipo, será que o meu amarelo não é o seu verde, na real? E há alguma forma de descobrir isso?

Difícil até de explicar o que estou querendo dizer (mais uma vez), mas talvez, desta vez, pode não ser falta de habilidade minha e, sim, parte inerente da questão. Venho pensando que a ordem do cético "só acredito vendo", pode estar invertida: nós, humanos, só conseguimos ver uma coisa quando arrumamos um jeito de descrevê-la. Por exemplo: você sabia que a noção do Azul é relativamente recente na história da humanidade? Tipo, o Azul já existia, é óbvio, nós o víamos mas não conseguíamos processá-lo, classificá-lo, entendê-lo. Antigas línguas como a Grega, a Chinesa, a Japonesa e o Hebraico simplesmente não tinham o termo "azul" dentro do seu dicionário. Só passaram a catalogá-lo muito recentemente. Blue is the newest color.

As evidências e todo o resto mais detalhado disso, você pode ver neste interessante artigo, mas o principal motivo que me interessa neste estudo me parece bem simples: o ser humano só funciona através do egocentrismo. É tudo auto-relativo. É sempre através de relações com nossa experiência que entedemos as coisas. Sabia que temos a "capacidade" de sempre pegar três elementos e relacionar a alguma forma humana? A gente vê três pontos de sombra no pescoço da Mili e falamos que é Jesus Cristo (um ser supostamente divino, mas semelhante à nós). É fofo e patético ao mesmo tempo. Mas voltando: então, branco e preto (e a noção de claro e escuro) foram as primeiras cores a aparecerem nos relatos mais antigos dos quais a humanidade conhece. Fácil entender; são os pontos máximos do espectro de nossa cútis. Depois veio o vermelho, cor do nosso sangue (o que nesta época bárbara era muito comum ser visto) e do vinho. Depois o amarelo e o verde e só muito tempo depois, foi aparecer alguma descrição do azul.

Mas po, como assim? O cara via aquele marzão besta e um céu azul e dizia que era o quê? Bom, Homero descreveu o mar como "cor de vinho tinto" e uma ovelha como "violeta". Ele podia estar sendo apenas poético, mas, se atendo ao que é fato e não conjectura, a galera daquela época era biológicamente igual a gente hoje em dia, ou seja, aptos a verem cor da mesma forma que a gente. Por que ele não disse que era azul como... aha! só podemos crer que eles não eram capazes ainda de processá-la porque, diferente das outras cores, o azul tinha pouco contato palpável com a vida do humano.

Se pararmos para pensar, o azul de fato é raro na natureza. Se hoje em dia ainda é "minoria", antigamente a proporção de olhos azuis era ínfima. Não tem muito animal azul; os que tem (pássaros em sua maioria) são migratórios e fulgazes; difíceis de serem "capturados" e contemplados e debatidos em uma época sem qualquer reprodutibilidade imagética (não existia internet, não existia foto, não existia tinta colorida). Um bom exemplo é que o termo azul surgiu primeiro na língua egípcia, que foi o primeiro povo a conseguir produzir uma espécie de tinta azul (possivelmente para a sombra de olho da Cleópatra). Vejam: só quando fizeram algo que você pega com a mão, que você sente, que dá um propósito e objetifica/verbaliza a coisa é que ela passa a existir. Entendemos "famoso"; entendemos "fama"? Sabemos o que é amar; sabemos o que é amor?

Enfim, tem muita coisa interessante aí. Leiam lá o artigo: tem a percepção das cores, tem o poder realizador da palavra (you can do it! you can do it!), tem um pesquisador que, sabendo disso, resolveu criar sua filha sem nunca descrever o céu como azul e ela, ao ser perguntada pela primeira vez sobre a cor do céu, não descreveu como azul e sim "sem cor". Tem um povo na Namíbia que usa a mesma palavra pra azul e verde e não consegue distinguir uma cor da outra.... Cabe a você bagunçar os Homenzinhos que moram no fundo da sua cabeça com essas referências e escolher um caminho para o qual eles devem trabalhar.

Aquele filme "The invention of lying" faz um pouco isso; conta a história do mundo antes de inventarem a mentira. Mas o roteiro é preguiçoso e iguala "honestidade" a "falta de filtro entre a boca e o cérebro", o que faz os personagens idiotas e você rapidinho fica "pfff, this is bullshit". Mas o mesmo esquema de "vamos ver o mundo antes da invenção ou concordância de uma convenção" pode gerar um belo filme se você se esforçar um pouquinho mais.

Ou então, pensar em algo que ainda NÃO convencionamos. Ora, se o Azul é recente em nossa história, quantas outras coisas podemos ainda não ter percebido/processado/convencionado? No Brainstorm do Fermi Paradox eu já aventei um pouco sobre isso. A existência (co-existência?) de outros seres vivos (alienígenas ou não) pode estar desde o início dos tempos aqui, entre nós, e simplesmente não conseguimos percebê-la. E esta noção aparece aqui de novo. Se você não começar a escrever essa parada eu vou, hein? =P

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